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sábado, 31 de março de 2012

Medicamentos genéricos no Brasil: uma pílula difícil de engolir para a grande indústria

A introdução dos medicamentos genéricos no Brasil há cinco anos transformou a indústria farmacêutica do país. Desde então, este tipo de fármaco foi ganhando mercado ano após ano e, atualmente, é responsável por 11,6% do total de unidades de medicamentos produzidas no país. Este fenômeno estimulou o crescimento da indústria nacional, diminuindo a participação dos grandes laboratórios internacionais e seus produtos de marca no mercado doméstico. No entanto, esta não é a única ameaça que afeta os grandes laboratórios com presença no Brasil. O governo, numa tentativa de negociar descontos de preços, ameaça violar as patentes dos medicamentos que compõem o coquetel para o tratamento da AIDS. Até o momento, esta ameaça não se materializou, mas, de acordo com as empresas internacionais, provocará a redução de investimentos da indústria farmacêutica no país.

A história dos genéricos no Brasil teve o pontapé inicial a partir da definição da Lei de Patentes, que regulamentou o instituto das patentes no país, dando caráter internacional a essa noção de que há direitos de exploração sobre um determinado produto, serviço ou idéia inovadora. Diante da proteção aos direitos dos detentores de patentes, o governo brasileiro decidiu regulamentar o setor de medicamentos, um dos mais criticados até então por não respeitar os direitos internacionais. Assim, o Brasil era o paraíso dos remédios copiados sem pagamento àqueles que possuíam o registro de criação de determinadas substâncias ou medicamentos.

Em 1999, o governo aprovou a Lei dos Genéricos, permitindo às empresas fabricar legalmente medicamentos que são cópias perfeitas das drogas cujo prazo de patente expirou. O resultado foi a introdução dos genéricos no Brasil, uma situação que incomodou, de início, os grandes laboratórios. A relação entre eles e os produtores de genéricos acabou se estabilizando, apesar do significativo crescimento da participação dos genéricos no mercado.

Atualmente, de todas as unidades produzidas pelo mercado nacional de medicamentos, 11,6% são genéricos, segundo números do terceiro trimestre de 2005. No item faturamento, o percentual de participação deste segmento está em 9,05%.

“O mercado de genéricos no Brasil, desde o seu lançamento, vem crescendo mês a mês. Vem crescendo em número de unidades, que é o mais importante, e em valor. Nos últimos quatro anos, no Brasil, o mercado farmacêutico esteve praticamente estagnado. Em contraposição, o mercado de genéricos cresceu muito, e continua crescendo”, afirma Vera Valente, diretora executiva da PróGenéricos (Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos).

Segundo Vera, quando se leva em consideração apenas os produtos que eram patenteados e não o são mais, os genéricos “roubaram” uma parcela considerável do mercado dos blockbusters, remédios de marca tradicionais dos laboratórios internacionais. “A gente tem uma análise em que pegamos os 50 principais produtos do mercado farmacêutico não-patenteados e comparamos a inserção dos genéricos: ela sai de uma participação inexpressiva em 2001 para hoje estar representando 41% desse mercado”, diz a dirigente.

Mesmo diante desses dados e levando-se em consideração que a indústria farmacêutica tem de fato se mantido estagnada nos últimos anos, representantes dos grandes laboratórios internacionais dizem que não há conflito na convivência com o genéricos. “Se o produto passa pela bioequivalência, pela bioestabilidade, pela biodisponibilidade, tem um método de fabricação perfeito e eu não tenho patente, nada mais justo que a entrada de genéricos. Então, nós não somos contra”, diz Jorge Raimundo, presidente do Conselho Consultivo da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa, que representa grandes laboratórios internacionais).

Para Jorge Raimundo, a indústria farmacêutica de pesquisa tem uma coisa extremamente importante a favor dela, que são os grandes investimentos que faz em pesquisa, as grandes descobertas e as patentes. “Todos os laboratórios quando descobrem, inventam e lançam um produto, têm, no mundo inteiro - e o Brasil é novo nessa área de patentes, ainda -, um período de exclusividade garantido por lei, que é para eles explorarem o objeto de sua patente. Nada mais justo que quando a patente se esgote é que então entre o genérico”, diz.

“Quando os genéricos entraram, parecia que a indústria farmacêutica era contra. Não, nós não éramos contra. Nós éramos contra o que estava sendo vendido como genérico, os remédios similares que se passavam por genéricos”, explica Jorge Raimundo.

O discurso parece bater justamente com o da própria indústria dos genéricos, que também vê como grande problema do mercado os produtores de remédios similares - que não investem em pesquisa de inovação nem, tampouco, buscam a bioequivalência e a biodisponibilidade para enquadrar-se como genéricos. “Nós somos aliados, porque temos um `inimigo´ em comum: os similares... Essa competição (entre genéricos e produtos de marca) já está mais estável e se percebeu que não é ela que traz problema para cada um ter sua fatia de mercado”, avalia Vera Valente.

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